“Nada grandioso entra na vida dos mortais, sem uma maldição’’.
É com esta afirmação atribuída ao filósofo Sófocles* que inicia o documentário “O dilema das redes“ disponível no Netflix*.
Partindo da verdade que a internet chegou à humanidade como algo que mudou definitivamente o destino da raça humana no planeta, o documentário também busca qual afinal é a maldição por trás de tamanha “benção’’?
Nele encontraremos importantes reflexões sobre como a sociedade tem usado a internet e as redes sociais, o papel que atribuímos a ela e o quanto temos nos deixado manipular por algoritmos que cada dia ocupam um papel cada vez mais importante na nossa vida pessoal e profissional.
Num diálogo rico e dinâmico com profissionais que atuaram na criação e desenvolvimento das principais redes existentes, o filme apresenta a visão de executivos, designers, engenheiros de tecnologia da informação, pesquisadores e estudiosos sobre o tema.
Além de diálogos, o documentário traz simulações de situações constrangedoras vividas no dia a dia por todos nós que buscamos as redes sociais e a internet para vender o nosso produto ou serviço, mas também para consumir, além de interagir com amigos e familiares, afinal tudo está ao alcance de um click.
Ninguém é capaz de negar os benefícios que a rede de computadores trouxe para a sociedade moderna, por isso mesmo é urgente refletir e lançar um olhar crítico à mesma, sobretudo quando não conseguimos imaginar como seria as relações econômicas e sociais caso a internet e as redes que nos ligam a elas deixassem de existir repentinamente. Você já imaginou o seu negócio, sua vida profissional e pessoal sem um eficiente mecanismo de busca?
O que estes especialistas nos alertam é: – Se você não paga por um produto, você é o produto!
Partindo desta afirmação, a nossa atenção se volta ao “o que estamos vendendo sobre nós sem ao menos termos consciência disso?” Sem dúvida, os preciosos minutos que dispomos ao olhar um post, uma notícia, um anúncio.
Quanto mais tempo nos dedicamos a um destes itens, mais dele chegará a nós através do feed de notícias daquela rede e é aí que mora o perigo, mas isto nós já sentimos no dia a dia, quando ingenuamente nos perguntamos: -Como este buscador* sabe que eu estou precisando disso?
Sob um designer de aparência viciante somos levados a viver em buscar de likes, nos preocupamos quando nosso post não provoca interesse, gerando questionamentos e sentimentos negativos. Se o conteúdo do nosso post trata do nosso produto ou serviço a questão é de cunho profissional, mas e se o conteúdo é pessoal muitas vezes o incômodo pode levar a consequências graves na saúde mental. Quando tratam-se de adolescentes aí o perigo é maior ainda, assunto que vem preocupando especialistas em todo mundo, que estudam casos de auto mutilação em busca da imagem perfeita, além de depressão severa ou mesmo suicídios.
As grandes empresas de tecnologia, as chamadas Big Techs trabalham com três metas junto aos seus usuários, 1) Engajamento, 2) Crescimento, 3) Propaganda e fazem de tudo para que estas metas sejam cumpridas à risca por mim, por você, por todos nós. As notificações não param de chegar e enquanto não cumprimos cada um dos itens programados, os “sininhos” não param de badalar.
Retomar a humanidade que existe em nós é um desafio da sociedade que, embora reconheçamos a importância da internet, temos que buscar um limitador que possibilite um controle maior na busca pela aceitação a todo custo. A questão é: Será que evoluímos para saber lidar com o que milhares de pessoas pensam ou dizem sobre nós?
A regulamentação é um caminho apontado por alguns especialistas ouvidos no documentário, a questão fiscal (taxação por volume de dados armazenados) é outro. Para eles, não pode haver um território livre, onde os cuidados com o outro sejam colocados em segundo plano, é preciso continuar cuidando das crianças, dos idosos, da natureza ao mesmo tempo que reduzimos as distâncias entre nós, o nosso cliente, nossos familiares e amigos, tudo isso usando uma mesma ferramenta.
Desta forma, o que seria uma “maldição”, pode finalmente ser apenas uma conquista.
Vale a pena assistir ao filme.
Raquel Fernandes
*O dilema das redes
Netflix
Tempo: 1h34m